Getúlio Vargas – Trabalhismo - Exceto a sua obra trabalhista, esta sim, de inspiração positivista,
devida à influência do positivista de Lindolfo Collor, o estado novo "não
passou do ramerrão narcisista; ora obscurecido pela opressão, ora sacudido pela
violência da repressão! O que não impedia seus partidários - como ainda hoje repetem tardios escribas- de dizerem que a ditadura estado-novista se inspirava ou equivalia à
Ditadura Republicana. O que, conforme com o acima exposto, é incontestavelmente falso!". (idem, 69). http://confucius.chez.com/clotilde/contacts/arthur/pseudo.xml
A CONTRIBUIÇÃO DE LINDOLFO
COLLOR AO TRABALHISMO NO BRASIL (*) https://juslaboris.tst.jus.br/handle/20.500.12178/88844
"A marcha do tempo consegue destruir completamente as
obras materiais dos homens, transformando-as em ruínas; só não consegue erodir
ou sufocar os seus sonhos e a sua criatividade".
A epígrafe que escolhi para abrir essa minha honrosa
participação neste magno conclave não está contida na obra dos pensadores ou
representa citação filosófica de um autor determinado, mas é tão-só uma simples
construção mental, extraída de minhas pessoais elucubrações e angústias sobre a
temporalidade do homem, contido e confinado irremediavelmente ao seu próprio
século, quanto à brevidade das coisas, e de nossa curta passagem nessa
formidável e fascinante aventura da existência. Mas creio também que é uma
reflexão apropriada à tarefa que me coube, de alta envergadura, na abertura
deste pioneiro "Primeiro Congresso Internacional de Direito Constitucional
do Trabalho", a que fui trazido pela gentileza do convite amigo e
indeclinável — verdadeiro dever de comparecimento — formulado pelo seu
Presidente, Dr. Aloísio Rodrigues — jurista e homem de cultura, companheiro de
memoráveis jornadas na Justiça do Trabalho: discorrer sobre a contribuição de
Lindolfo Collor ao trabalhismo no Brasil.
Compareço ainda, para abordar essa temática oportuna e feliz,
na condição desvanecedora de ter sido escolhido Presidente da Comissão Federal
incumbida de comemorar, em todo o decorrer de 1990, o centenário de nascimento
desse notável patriota. Minha dupla e vultosa responsabilidade, de coordenar
aqueles eventos e de traçar o perfil proposto — embora missão grata, por
mergulhar na análise da obra de um grande brasileiro, com quem tanto me
identifico pelas nossas origens telúricas, intelectuais e familiares comuns, se
atenua significativamente, por ter sempre ao meu lado, nesses desafios
ingentes, a dama distinta, de presença forte, operosa e realizadora, que é a
Dra. Leda Collor de Mello, filha deste brasileiro ímpar, marcante estadista da
transformação.
A participação neste Congresso propicia-me ainda a visita,
que muito me alegra, a este sobranceiro, progressista e valoroso Estado do Rio
Grande do Norte e ao seu povo hospitaleiro, prestante e bom, que saúdo frater-
(*) Conferência proferida pelo Ministro Marco Aurélio Prates
de Macedo, na abertura do I Congresso Internacional de Direito Constitucional
do Trabalho realizada em Natal, RN, de 10 a 13 de abril de 1990.
Os primeiros passos de Lindolfo Collor na vida política
dão-se através do “Bloco Acadêmico Castilhista", formador da chamada
"Geração de 1907“, que atuava na renovação do poderoso Partido Republicano
Rio-Grandense. Devo esclarecer que sou parente de Júlio Prates de Castilhos, o
que me leva a emocionar-me, ao recordar os fatos políticos e culturais do
início do século, onde homens da envergadura de Lindolfo Collor, Flores da
Cunha, Osvaldo Aranha, Getúlio Vargas, Maurício Cardoso, Firmino Paim Filho,
dando suporte político ao líder incontestável da época, o Presidente da minha
província, Borges de Medeiros, abriam caminho para que, após a revolução de
trinta, quatro tenham se tornado ministros de estado, um tenha sido interventor
e Governador, e Vargas, presidente por dezenove anos.
Essa geração de 1907 não somente renovou a política nos pagos
meridionais, mas ascendeu ao poder federal, no bojo de uma revolução, que
transformou as instituições do País e sedimentou uma nova estrutura de poder,
do âmbito federal ao regional, modernizando-o institucionalmente, sepultando o
que se convencionou chamar de “República Velha”.
Vale ressaltar que a plêiade de jovens políticos da geração
castilhista de 1907 era formada quase que exclusivamente por bacharéis em
direito, a única exceção era a de Lindolfo Collor, formado em farmácia.
Interessante ressaltar que este homem, formado academicamente
para a vida na botica, teve uma atuação multifacetária: poeta na juventude,
jornalista, diretor de jornal, político, deputado estadual, deputado federal,
conspirador pela revolução de 1930, financista, Ministro de Estado, opositor à
ditadura Vargas, exilado político. O seu compromisso e trajetória superaram os limites
das querências meridionais e se projetaram nacionalmente, consolidando uma
figura exponencial de estadista, voltado para os humildes, os “sem-empregos” de
então, os descamisados e pés no chão de hoje.
Numa época em que dominava a política conservadora no País,
afirmava Lindolfo Collor os valores da renovação, da mudança, da transformação,
num ponto de vista de amparo e libertação do homem humilde, desamparado, ao
sabor das forças econômicas espoliativas, cujo apetite de lucro não transigia
diante da desproteção do nosso operariado, como se pode recolher de excertos de
seus escritos.
“Eu tenho — para bem falar a verdade — um grande, um
incoercível receio da solicitude com que os nossos legisladores estão
examinando a questão social. A experiência demonstra que nada tem sido tão
fatal ao Brasil como essa boa vontade de última hora, dos seus representantes.
Não é meu Intuito fazer paradoxos, primeiro, porque isto não é dos meus hábitos
e, segundo, porque o caso é demasiado grave para que alguém possa ter o mau
gosto de o tratar de “coeur léger", assim como quem vai comentar, por
desfastio, um assunto qualquer posto em foco por circunstância de momento.”
“Engana-se profundamente quem supuser que dentro da nova
ordem de coisas que nasce com o fim da luta das potências, será possível ainda
ir iludindo a verdadeira situação do proletariado e adiando a sua definitiva
Incorporação moral e econômica na civilização ocidental, que é também a nossa.
A consciência do mundo está amadurecendo para a reforma social. Um ano, dois,
cinco, dez, o prazo final pouco importa. O fato é que os explorados se levantam
contra os exploradores. Uma mentalidade retrógrada poderia objetar que isto é
uma coisa velha, que Spartacus já tentou em Roma o que a Revolução Francesa
impôs, em parte, ao mundo. Mas a verdade das coisas é muito diferente. O que
não passava de arrancos pessoais ou, quando muito, de movimentos nacionais, é
hoje uma aspiração universal."
“A balança social se mantinha em equilíbrio até aqui, porque
num dos seus pratos pesava o ferro das carabinas, o aço das espadas, o bronze
dos canhões. E já então não será possível dizer com exatidão a que espetáculos
assistirá o mundo atônito e até onde irá a resistência da nossa civilização,
cujas conquistas estão sendo malbaratadas por espíritos que não compreendem as
grandes verdades que andam no ar... ”
“Como as condições econômicas variam infinitamente de Estado
a Estado, compreende-se que neste particular — e eu tenho como fora de dúvida
que este é o aspecto central da questão — nós temos que fazer obra nossa,
exclusivamente nossa, procurando ver, antes de tudo, onde estão, para o
bem-estar do proletariado, as falhas do nosso sistema econômico, a fim de lhe
dar remédio seguro e de acordo com as possibilidades e imposições do meio.”
“Os doutos da Câmara vão estudar a questão. Oxalá eles
enveredem direito pelo verdadeiro caminho, lembrados de que em um país
economicamente desordenado, como o nosso, todas as tentativas de justa
organização social são sempre falhas, por artificiais e inexpressivas na
realidade dos fatos. A legislação social, entre nós, deve ter por base uma
revisão conscienciosa do nosso sistema de impostos que é, na finalidade do seu
empirismo espantoso, uma verdadeira máquina de sucção assestada às costas do
proletariado. Emite-se o papel-moeda em jatos contínuos para ocorrer às
despesas ordinárias do Tesouro. A vida, em consequência, encarece de modo
fantástico.”
“Não satisfeitos com isto, os nossos legisladores não se
cansam de tributar os gêneros de primeira necessidade. Haverá, socialmente,
alguma coisa de mais injusta e vergonhosa? E que fim levaram as emissões de
papel que tanto pesam na economia dos humildes? Elas estão todas entesouradas
nos bancos e presas nas mãos de algumas centenas de particulares. E esses
bancos e particulares, que fazem para minorar a carestia geral e tornar menos
angustiosa a situação financeira do país? Já se lembrou o poder legislativo de
lhes taxar as rendas formidáveis conseguidas à custa da miséria geral? Ah! Isto
não! O imposto sobre a renda é ainda considerado iniquidade no Brasil! Quando
alguém fala nisto, lá vêm todas as citações de economistas da escola
capitalista, e depois dos mais absurdos sofismas a coisa continua no mesmo pé!
— Os pobres pagando impostos para fazer a fortuna dos ricos."
“Eu tenho a coragem de dizer que o regime tributário
brasileiro é a vergonha dos nossos estadistas milionários. São estes que vão
agora, salvo raras exceções, encaminhar a solução do nosso problema proletário.
Será excesso de pessimismo prever o insucesso dessa tentativa?”
“Oxalá eu me engane. Mas por enquanto, a minha convicção é
esta: a questão ora em debate não pode ser resolvida no Brasil, sem que se
anime o sistema tributário de um espírito de justiça social. Mas como esse
espírito de equidade vai contra os interesses dos poderosos, eu tenho e guardo
as minhas dúvidas sobre a sua aplicação final."
Estou a ler faz muito tempo trechos de um artigo de Lindolfo
Collor, este homem contemporâneo do futuro, escrito em “A Tribuna", do Rio
de Janeiro, em 15/5/1919, que mantém atualidade nos nossos dias.
Quis o destino, nos seus indecifráveis traçados, que um neto
de Lindolfo Collor, o jovem e impetuoso Presidente Fernando Collor, em momento
dramático do nosso País, tivesse o poder supremo para reverter e corrigir esse
quadro, que "mutatís mutandis” revela significativos traços de
oportunidade.
O longo trecho citado, retirado da obra jornalística de
Lindolfo Collor revela seu engajamento em favor das causas dos oprimidos, a sua
visão crítica da realidade nacional, em aspectos variados, que permanece válida
até os dias de hoje. Duas conclusões podem ser extraídas da sua obra: a
primeira, a de que a sua abordagem reflexiva sobre a realidade nacional, feita
com notável profundidade, permanece adequada à nossa realidade atual, fruto da
sua perspicácia e visão de futuro.
A figura extraordinária de Lindolfo Collor deixou marcos em
campos distintos da cultura nacional, mas o objetivo desta palestra é situar a
sua obra no âmbito trabalhista.
A pesquisa histórica revela que o autor intelectual do
manifesto da Aliança Liberal, dirigido à nação e destinado a dar suporte à
campanha oposicionista ao governo de Washington Luiz, é da lavra de
Lindolfo Collor. Afora as disposições constantes deste documento, acerca da
pregação de renovação da estrutura econômica e social do País, há o compromisso
expresso de solucionar a chamada “questão social”. Vitoriosa a revolução de 30,
materializou-se o compromisso expresso à nação na plataforma eleitoral, através
da criação do Ministério do Trabalho, que abrangia também as áreas da Indústria
e do Comércio.
O primeiro titular dessa área foi Lindolfo Collor. A sua obra
de engenharia política e institucional foi notável. Cercou-se de uma equipe de
pessoas que já se tinham distinguido como lutadores sociais, onde despontavam,
entre outros, Evaristo de Moraes, Joaquim Pimenta, Deodato Maia, Carlos Cavaco,
que dão substância técnica e obstinada vontade de realização, consagrada nas
lutas sociais, à viabilização institucional do novo ministério e à edição de
novas leis, indispensáveis à regulação moderna das relações de trabalho
existentes à época.
A dimensão da obra de Lindolfo Collor deve ser aferida,
diante do fato de ele não ser bacharel em Direito. Todavia, a sua formação
humanística, a experiência política, parlamentar e Jornalística lhe davam o
embasamento necessário para enfrentar o desafio, superando a ausência de
formação acadêmica específica com a experiência e o talento de estadista.
Há uma versão equivocada na história da legislação
trabalhista do Brasil. Atribui-se à Revolução de 30 a construção da legislação
social no Brasil. Penso que é hora de estabelecer-se uma retificação desse
equívoco de interpretação histórica. As origens sistemáticas da legislação do
trabalho no Brasil remontam ao Código Comercial, de 1850, e ao Código Civil, de
1916.
Na República Velha foram instituídas leis assegurando
direitos sociais aos trabalhadores. São de serem assinaladas as leis que
disciplinaram o direito de sindicalização, de 1903 e 1907. A Lei n. 3.724, de
1919, disciplinou as obrigações decorrentes dos acidentes de trabalho. O
Decreto n. 16.027, de 1923, instituiu o Conselho Nacional do Trabalho. E a lei
de outro conterrâneo, Elói Chaves, de n. 4.082, publicada em 1923, criou a
Caixa de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários. Em 1926, a regulação dessa
Caixa foi estendida aos trabalhadores das empresas portuárias e marítimas. O
direito às férias é de 1925; o Código de Menores estabelece regras disciplinando
o seu trabalho.
Tem-se assim que a legislação anterior a 1930 estabelece
vários direitos fundamentais para o trabalhador, tais como disciplina da
jornada de trabalho, descanso dominical, regulação do trabalho do menor, férias
remuneradas de 15 dias, caixas de seguro, indenização por acidentes de
trabalho, e estruturação mínima do sindicato.
Entretanto, à essa legislação falecia eficácia. Tais
direitos, num País da grandeza territorial do nosso apresentavam níveis
diferenciados de aplicação. No Rio de Janeiro e São Paulo tinham um grau maior de
reconhecimento, ao passo que nas outras regiões correspondiam a meras
exortações, carentes de efetividade.
A grande transformação introduzida pela Revolução de 1930, na
área das relações trabalhistas, sob a lúcida e eficaz condução de Lindolfo
Collor, foi exatamente, cumprindo os compromissos da campanha, dar consequência
prática a tais compromissos, garantindo os direitos dos pobres, dos oprimidos,
dos deserdados da fortuna e da justiça, dos operários. Fazer uma legislação
social voltada à proteção de seus interesses, reconhecendo a necessidade de
defesa desses setores, tratando as relações trabalhistas com a necessária
dignidade e o indispensável abroquelamento jurídico, superando entendimento,
típico da fase anterior, de que a questão social era uma questão de polícia.
A obra realizada por Lindolfo Collor, no atendimento dos
compromissos da revolução de 1930, pode ser subdividida em vários cortes:
primeiro, dar consequência às promessas da plataforma e do ideário da campanha
e da revolução vitoriosa, em favor dos deserdados; segundo, viabilizar a
disciplinação modernizante e reformista das relações de trabalho, superando a
repressão e o conservadorismo da “Velha República", dando caráter de convergência
e colaboração à legislação trabalhista, no relacionamento das classes, de sorte
a superar o conceito de luta de classes; terceiro, especificar a legislação
social do Brasil, face a sua realidade, rejeitando a importação de modelos de
disciplinação consagrados em outros países; quarto, promover a assunção pelo
Estado do controle das relações de trabalho e dos conflitos entre o trabalho e
o capital; quinto, estabelecer a defesa do trabalhador brasileiro, em face da
imigração da mão-de-obra para o País; sexto, criar uma instituição — o
Ministério do Trabalho — destinada a conduzir uma política social no País,
eficaz e intervencionista, no sentido de proteção à parte mais fraca na relação
empregatícia.
Lindolfo Collor, em palavras sensatas e racionais, definia o
seu diagnóstico, as suas perspectivas, as correspondentes diretrizes do quadro
em que atuava, em discurso proferido no Rotary Club, em 26 de dezembro de 1930;
“Todas as atividades estrangeiras, honestas e respeitosas da
nossa soberania, são bem-vindas ao Brasil. Mas é natural que, estabelecidas
aqui, contribuam para o bem-estar dos brasileiros, ao invés de continuarem a
ser corpos estranhos e inadaptáveis localizados em nosso país, dele auferindo
lucro sem deixar uma parcela correspondente a vantagens sociais."
“O amparo do trabalhador nacional não poderia, por isto
mesmo, deixar de ser o início da ação governamental, uma vez criado o
Ministério do Trabalho. Isto conseguido, com os efeitos decorrentes do decreto
que regula o assunto, teremos de lançar as nossas vistas sobre as relações
entre o capital e o trabalho, que formam a base, por assim dizer,
de toda organização social”.
“Não nos iludamos quanto às dificuldades práticas que se
opõem à construção desse novo edifício jurídico.”
“As dificuldades dos patrões e os sofrimentos dos operários
têm de ser encarados em função da crise que o país está atravessando.”
“Por isso mesmo que todo esforço brasileiro deve tender para
a grandeza e felicidade do Brasil. Nem os operários nem os patrões têm o
direito, por mais justos que sejam os seus interesses e reivindicações, de
perder de vista a própria sorte do país, que é o que está em jogo e deve
preocupar as atenções de todos nós.”
“É tempo já de substituirmos o velho e negativo conceito de
lutas de classes pelo conceito novo, construtor e orgânico, de colaboração de
classes. A nova República Brasileira propõe-se a dar expressão legal e real a
essas novas diretrizes sociais.”
“A luta das classes encontra as suas origens em condições
retrógradas, que nós refugamos por absurdas e atentatórias da própria dignidade
do Estado.”
“Tanto o capital como o trabalho merecem e terão o amparo e
proteção do Governo. As forças reacionárias do capital e as tendências
subversivas do operariado são igualmente nocivas à Pátria e não podem contar
com o beneplácito dos poderes públicos. Capital e trabalho, no Brasil, têm uma
função brasileira a cumprir, e essa função se há de realizar dentro dos mais
rigorosos ditames da justiça".
“A regularização jurídica das relações entre o capital e o
trabalho obedecerá, pois, entre nós, ao conceito fundamental da colaboração de
classes”.
“Não há nenhuma classe, seja proletária, seja capitalista,
que possa pretender que os seus interesses valham mais do que os interesses da
comunhão social. O Brasil primeiro, depois os interesses de classes”.
Eis neste trecho citado, a afirmação da nacionalidade, e a
determinação coerente e segura dos limites saudáveis de atuação do capital e da
mão-de-obra estrangeiros.
É feita também a abordagem consciente dos dilemas,
dificuldades, angústias e consequências do relacionamento entre o patronato e o
operariado.
E, finalmente, consagra-se a mensagem de paz, segurança e
estabilidade nas relações trabalhistas que o Direito do Trabalho deve exercer,
no sentido de buscar a cooperação de classes, amortecendo eventuais conflitos
que acirrem a luta de classes.
O primeiro ponto abordado após a criação e instalação do
Ministério do Trabalho foi a questão da proteção ao trabalhador nacional em
face da imi-
gração de mão-de-obra estrangeira. E tal questão foi
disciplinada através a chamada Lei dos 2/3, consagrando duas características
básicas para a proteção da mão-de-obra nacional: regulação da imigração e
medidas de enfrentamento ao desemprego. Várias providências foram adotadas para
regular essas matérias, principalmente objetivando a absorção de mão-de-obra
nacional. Assim, foram criados postos de recrutamento dos desempregados, bem
como construídos núcleos de povoamento para ocupação efetiva do território
nacional e colocação da mão-de-obra ociosa.
Na área da Previdência Social deflagra-se um processo de
expansão do seguro social, mediante a ampliação das categorias abrangidas pelas
Caixas de Aposentadoria e Pensões. Entretanto, somente em 1933 é que são
Instituídos os Institutos de Aposentadorias e Pensões, graças aos estudos,
debates e pesquisas iniciados na primeira gestão do Ministério do Trabalho,
dando bases mais firmes para o seguro e assistência social.
A Lei de Sindicalização de 1931, tanto do patronato, quanto
do operariado, teve o efeito de produzir a organização dos dois lados da
relação de emprego, dando exequibilidade ao controle estatal dos conflitos e,
por outro lado, organizando racionalmente as reivindicações e os litígios
correspondentes. Tal lei é tipicamente brasileira, atenta às nossas
peculiaridades:
A análise superficial identifica a influência decisiva da
“Carta del Lavoro”, de Mussolini, em face da consagração do princípio da
colaboração entre as classes e sua cooperação com o Estado. Todavia, a
influência da legislação francesa é mais marcante, se se considerar o modo de
congregação das profissões idênticas, de sorte a formarem Sindicatos,
Federações e Confederações.
Que houve influências do direito comparado, principalmente do
europeu na matéria, não resta dúvida. Mas o texto produzido corresponde às
peculiaridades e necessidades nacionais, ressaltando-se sua índole
modernizadora. Estabelece tal lei o princípio da unicidade sindical, para
evitar o enfraquecimento sindical, mediante o seu fracionamento.
Parte substancial da obra de Lindolfo Collor não é,
entretanto, transformada em lei durante a sua gestão. Os projetos de lei e
respectivas exposições de motivos, por ele propostos, em face das dificuldades
da época — decorrentes da resistência de vários setores, inclusive internos ao
governo — só vão frutificar, após a sua saída do Ministério do Trabalho,
durante a gestão de Salgado Filho.
Constitui esse material obra tão valiosa, rica e nobre quanto
aquela que foi editada:
• A duração da jornada de trabalho na indústria e no
comércio, reduzida para oito horas diárias ou quarenta e oito horas semanais.
30
• A instituição do salário mínimo, cumprindo compromisso da
Aliança Liberal.
• A criação do embrião da Justiça do Trabalho, por meio da
instituição das Comissões Mistas de Conciliação entre empregadores e
empregados.
• A regulação do trabalho das mulheres e dos menores.
• A criação das Convenções Coletivas de Trabalho,
O período de gestão de Lindolfo Collor no Ministério do
Trabalho, inferior a dois anos, foi tipificado por grandes realizações,
valorizando o direito do trabalho, e apresentando soluções para as várias
questões viabilizadas posteriormente à sua saída.
O Brasil é um país reconhecidamente de fraca memória. Mesmo
assim, tem seus vultos reverenciados por influência dos historiadores oficiais,
e marginalmente consagra alguns guerreiros, heróis e atletas populares.
Sobre algumas figuras de destaque, homens decisivos de seu
tempo e que projetaram realisticamente o futuro, tem palrado um silêncio e um
olvido, produtos de interesses de hegemonia política ou menosprezo ao trabalho
intelectual.
É de ver-se que comemorou-se aqui, neste País, com maior
brilhantismo o bicentenário da revolução francesa do que o centenário da
República Brasileira.
Não há cultura, não há história que se queira fazer valiosa,
que não perscrute o passado, fora das preferências políticas, ou vieses
ideológicos. É o que estamos nós a fazer, sob a inspiração de D. Leda Collor de
Mello, que, desde muito, como filha-herdeira de uma valiosa herança cultural e
política de seu pai, generosamente a oferece ao público deste País, rompendo a
cortina do silêncio sobre a obra magnífica de seu progenitor. Ao conhecê-la,
possa o povo e todos os seus estamentos desvendar as origens do direito do
trabalho e do direito sindical no Brasil, e a sua fase áurea, definindo
adequadamente a sua paternidade, atribuída pela história oficial e
comprometida, a autorias espúrias e duvidosas, que somente a conspiração do
silêncio e da hipocrisia fazia triunfar.
Este velho magistrado, de quarenta anos dedicados à Justiça,
e de quase quatro décadas vividas na Justiça do Trabalho, relembrando as
origens comuns com o homenageado, o estadista Lindolfo Collor, vê a nossa
querência gaúcha com a orografia de pampas e coxilhas, e conclui que, na
geografia da história do direito do trabalho, do direito previdenciário, do
direito sindical, e da política brasileira, Lindolfo Collor é magnífica, imponente
e eterna cordilheira, a avultar na paisagem da história pátria.